Em comunicado oficial, TV Globo e Grupo Bandeirantes anunciaram na última terça-feira (3) o término de uma parceria vigente desde 2007 para transmissões de futebol no Brasil. A emissora paulista alegou questões financeiras, abriu mão de sublicenciar a exibição dos jogos a partir desta temporada e colocou a cúpula do canal carioca em busca de um novo parceiro/concorrente. Mas afinal, por que a Globo precisa dividir com outro canal o conteúdo que poderia ter com exclusividade na televisão aberta?
A primeira questão é contratual. Concorrências por direitos de mídia de competições são definidas por uma série de questões que considera aspectos como valores e espaço na grade. Para fechar com entidades como Fifa e Uefa, por exemplo, a Globo precisou se comprometer a exibir em rede aberta uma determinada quantidade de eventos.Portanto, ela precisa de um parceiro para desovar conteúdos que não gostaria de encaixar em sua grade.
Sem a Band, teria de optar entre encontrar um novo destino para esses eventos ou exibir jogos que dão menos retorno do que outros produtos não-esportivos – partidas de futebol de base, futebol feminino e fases preliminares de torneios como a Liga dos Campeões da Uefa, por exemplo.
Outro aspecto é a promoção. Segundo o Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica, órgão que regula mercados e combate monopólio em âmbito nacional), a Globo não é obrigada a repassar os direitos do Campeonato Brasileiro. Contudo, parceiros de transmissão aumentam o espaço do torneio na TV aberta – não apenas com exibição de jogos, mas com jornalismo, análise e similares. Isso fomenta o consumo daquele conteúdo, e um número maior de pessoas vendo futebol tende a ampliar também a audiência da emissora líder.
O contrato da Globo com os clubes que disputam o Campeonato Brasileiro vai até a temporada 2018. Horas depois de o desfecho da parceria com a Band ter sido anunciado, RedeTV! e TV Brasil procuraram a emissora carioca para fazer uma consulta sobre o futuro.
No caso da RedeTV!, a Globo entende que o canal não tem hoje a estrutura adequada para exibir o Campeonato Brasileiro. Um avanço na negociação dependeria fundamentalmente do potencial de investimento do canal paulista, portanto. A TV Brasil já exibe a Série C do certame nacional e vinha se preparando para aumentar o aporte no futebol, mas hoje vive cenário de incerteza por causa da conjuntura política – o canal é público e se mantém com verba do governo federal.
Para outras emissoras de rede aberta, os impeditivos são diferentes. O SBT teria de abrir espaço para o futebol em horários que hoje são voltados a outro tipo de público, por exemplo. A Record, que foi parceira da Globo antes da Band, já disse que considera inviável o modelo vigente.
A Bandeirantes paga atualmente uma cota de U$ 50 milhões para a Globo (cerca de R$ 175 milhões). Para bancar isso, precisa amealhar ao menos R$ 250 milhões entre anunciantes – o valor não considera sequer os custos de produção e operação. A emissora paulista vive um momento financeiro conturbado, e a decisão de cortar a parceria tem a ver com isso.
A busca da Globo por um novo parceiro também dependerá fundamentalmente do mercado publicitário. O atual período do ano já é naturalmente uma fase em que canais tateiam o ambiente em busca de anunciantes, e o surgimento de um novo interessado pelo futebol dependerá das reações de quem pode pagar a conta.
Nesse aspecto, aliás, pesa outro ponto sobre a decisão da Band. O canal anunciou o fim das transmissões do futebol, mas ainda não oficializou o quanto o esporte vai perder espaço em sua grade. Se mantiver os programas voltados ao tema, portanto, pode continuar brigando por anunciantes interessados no segmento.
O anúncio do término da parceria com a Globo instaurou clima de tensão entre funcionários da Bandeirantes. Existe expectativa de corte para os próximos meses – depois da Eurocopa deste ano, provavelmente. A emissora já havia perdido a Série B do Campeonato Brasileiro para a RedeTV! e já havia deixado de exibir em 2016 a Copa do Brasil.
Custos
O custo de operação da Globo para transmitir futebol não é divulgado oficialmente, mas a emissora diz que desembolsa R$ 1,5 bilhão anual apenas com o Campeonato Brasileiro. São seis anunciantes (Ambev, Banco Itaú, BRF, Casas Bahia, Johnson & Johnson e Vivo), e cada um deles desembolsou R$ 245,7 milhões pelo pacote futebol em 2016. O valor inclui todos os eventos da modalidade que o canal exibe.
Procurada pela reportagem do UOL Esporte, a Globo respondeu: “Tudo que temos a dizer está no comunicado”, em referência à nota de terça-feira.
* Eduardo Ohata, Guilherme Costa, Luis Augusto Simon, Pedro Ivo Almeida, Ricardo Perrone, Rodrigo Mattos e Rogério Jovanelli
Do UOL, no Rio de Janeiro e em São Paulo