A guerra comercial desencadeada pelo presidente dos Estados Unidos (EUA), Donald Trump, deve causar reflexos na economia brasileira, que podem ser sentidos com maior pressão inflacionária, aumento de juros, imprevisibilidade e diminuição do ritmo de comércio internacional, além de taxação direta de exportações brasileiras. O cenário é traçado por economistas ouvidos pela Agência Brasil.
Na terça-feira (4), começou a vigorar a taxação adicional de 10% aplicada a produtos chineses. O país asiático reagiu de imediato, impondo tarifas a produtos americanos, como carvão, gás natural e maquinário agrícola. Há a expectativa de um contato entre Trump a autoridades chinesas nas próximas horas.
Os vizinhos americanos México e Canadá conseguiram, após conversas com Trump na segunda-feira (3), suspender por 30 dias uma sobretaxação de 25%. Os anúncios foram feitos pela presidente mexicana, Claudia Sheinbaum, e pelo primeiro-ministro canadense, Justin Trudeau.
Os três países têm superávit comercial com os Estados Unidos, ou seja, vendem mais do que compram dos americanos. O Brasil vive situação oposta, tem déficit comercial, comprou mais do que vendeu aos americanos. Mesmo nessa situação, acreditam especialistas, o país deve receber reflexos da guerra de tarifas.
Imprevisibilidade
De acordo com a economista Lia Valls Pereira, professora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) e pesquisadora associada do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), a imprevisibilidade criada por Donald Trump é um dos primeiros grandes reflexos que afetarão a economia mundial, incluindo o Brasil.
“É tudo muito incerto, hoje é uma coisa, amanhã pode ser outra”, disse a economista à Agência Brasil logo após o anúncio da suspensão da taxação de itens mexicanos e antes do alívio aos canadenses.
“Um dos piores efeitos é esse grau de imprevisibilidade que causa no comércio. Comércio internacional é uma coisa que tem planejamento, tem contrato. Se você fica em cenário totalmente incerto, é ruim para todos, inclusive para o Brasil”, afirma.
Retaliações
Donald Trump também tem ameaçado a União Europeia (UE) com a taxação de importações americanas. A UE tem dito que “deve responder com firmeza a qualquer parceiro comercial que imponha tarifas injustas ou arbitrárias sobre produtos do bloco”.
Antes de chegarem a um acordo com Trump, México e Canadá tinham prometido medidas retaliatórias, caminho efetivamente seguido pela China.
“Se todo mundo começar a aumentar a tarifa, o comércio internacional recua, a demanda mundial recua”, afirma Valls.
Para o professor de economia da Uerj Caio Ferrari, uma guerra tarifária tem potencial para provocar a desaceleração da economia mundial. Segundo ele, à medida que os países colocam retaliações em prática, a economia mundial diminui.
“Os ganhos do comércio, da especialização e da escala de produção eficiente global se reduzem. Isso afeta o Brasil na medida que as exportações brasileiras dependem da renda gerada no resto do mundo”, diz Cario Ferrari.
O professor explica, que se a renda é menor, a demanda por exportações é menor. “Logo, teríamos um prejuízo ao setor externo exportador brasileiro”, completa.
Comércio Brasil-EUA
Em 2024¸ a balança comercial entre Brasil e Estados Unidos ficou negativa no lado brasileiro em US$ 253 milhões. Vendemos para os americanos US$ 40.330 milhões e compramos US$ 40.583 milhões, de acordo com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic).
Os EUA são o segundo principal parceiro comercial do Brasil, atrás da China. Os itens que mais vendemos para os estadunidenses foram petróleo (14% do total exportado), produtos semiacabados de ferro ou aço (8,8%), aeronaves, incluindo partes e equipamentos (6,7%) e café (4,7%).
Apesar do déficit comercial brasileiro, Donald Trump já fez menções ao Brasil como um dos países que também podem ter itens taxados. Segundo o governante americano, o Brasil e a América Latina precisam mais dos EUA do que o inverso.
Enquanto o Brasil foi o nono maior importador de produtos dos EUA em 2024, segundo dados até novembro do governo americano, somos apenas o 18º que mais exporta para eles.