Um dos pontos polêmicos da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287/2016, que reforma a Previdência brasileira, é a idade mínima de 65 anos para requerer aposentadoria. Além de igualar os critérios de elegibilidade para homens e mulheres se aposentarem, o que tem causado críticas, a fixação da idade nesse patamar é apontada como um sacrifício no caso de trabalhadores braçais, que fazem tarefas que demandam força física e boa saúde.
O professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) Arthur Bragança de Vasconcelos Weintraub, doutor em direito previdenciário, propõe uma solução para a questão dos trabalhadores braçais. O especialista sugere adaptar à realidade brasileira um modelo existente em outros países: a aposentadoria fásica. Nesse sistema, o trabalhador diminuiria o ritmo das atividades gradualmente.
Segundo Weintraub, Canadá, Itália, Espanha, Estados Unidos, Peru, Austrália e Reino Unido são alguns dos países que já têm a aposentadoria fásica como parte do seu sistema previdenciário. O professor explica que nos EUA, por exemplo, a ideia é que empregados experientes, com muitos anos de empresa, afastem-se do trabalho aos poucos a fim de se pouparem e, ao mesmo tempo, continuar contribuindo com o seu expertise. No Brasil, o objetivo seria um pouco diferente.
“No Brasil, se colocar idade mínima, o motorista de ônibus e o pedreiro não conseguem contribuir. Como se faz para proteger o pobre, os dois terços [de beneficiários] do regime geral que ganham um salário-mínimo? Aposentando-os gradualmente. Você não fica velho de uma vez. Na aposentadoria fásica, você começa a receber 25% [do benefício] e trabalhar menos”, exemplifica.
Na avaliação de Weintraub, “para o trabalhador que não consegue emprego, ou está fisicamente esgotado” seria “um imenso alívio receber antecipadamente” os recursos da aposentadoria, ainda que abaixo do valor cheio. A sugestão do professor é que o pontapé inicial para a aposentadoria fásica seja a partir dos 50 anos, quando o trabalhador, com a condição de ter atingido 20 anos de contribuição, deixaria de pagar a Previdência. As empresas continuariam contribuindo.
A partir dos 55 anos, o trabalhador poderia receber 25% do salário-mínimo. Aos 60 anos, poderia ter acesso a 50%. Nos dois casos, seria necessário ter no mínimo 20 anos de contribuição. Aos 65 anos, o trabalhador, com 25 anos de contribuição, poderia pleitear 75% do salário-mínimo. Por fim, somente aos 70 anos e com 30 anos de contribuição seria possível ter acesso ao valor integral.
Acima do mínimo
Segundo o modelo, a aposentadoria fásica também poderia estar disponível para valores acima do piso do benefício, ou seja, do salário-mínimo. Nesse caso os participantes teriam, cada um, uma conta individual capitalizada por suas contribuições e juros. O sistema de contas individuais é diferente do vigente atualmente no Brasil, onde existe uma Previdência compartilhada.
Conforme a opção do trabalhador, ele poderia receber o equivalente a 2,6 salários aos 55 anos; 6,5 aos 60; 9,75 salários aos 65 anos e, por fim, o correspondente a 13 vezes o salário mínimo vigente aos 70 anos. Poderia, ainda, seguir trabalhando e contribuindo mesmo recebendo o valor parcial.
O professor da Unifesp diz que a proposta do governo para a Previdência tem mérito pelo fato de a reforma ser “necessária” e “urgente”. Ele destaca que hoje a despesa do regime geral, que abarca os segurados do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), está em 8,5% do Produto Interno Bruto (PIB, soma dos bens e riquezas produzidos em um país) e, em 2050, deve chegar a 18%. No entanto, na avaliação do especialista, apenas a fixação da idade mínima “não resolve”.
Dada a urgência da aprovação de uma reforma a fim de sinalizar estabilidade fiscal aos investidores e ajudar a reativar a economia, Weintraub propõe a implementação de mudanças em caráter emergencial. Uma alternativa, segundo ele, seria aprovar a atual reforma e deixar explícito que haverá um plebiscito para substituir as mudanças pelo modelo de aposentadoria fásica até o ano de 2020.
Previdência clássica
Para o especialista em Finanças Públicas José Matias-Pereira, da Universidade de Brasília (UnB), é importante que todo tipo de proposta seja ouvida em um debate como o da reforma da Previdência. Ele acredita, contudo, que no atual momento de fragilidade econômica enfrentado pelo Brasil é preferível uma “Previdência clássica”.
“Eu entendo que do ponto de vista financeiro, atuarial, você tem que estruturar a Previdência para que ela possa se sustentar ao longo do tempo. É fundamental que a gente enfrente o problema do déficit e, para isso, o melhor é a gente se encaminhar para uma Previdência clássica, que não se preocupa em abrir exceções. Para mim, os militares também deviam estar nessa reforma”, disse.
Para Matias, a aprovação da atual reforma da Previdência abrirá caminho, inclusive, para a alocação em outras rubricas de gastos que hoje sobrecarregam o sistema previdenciário. Na avaliação do especialista, o governo não pode se descuidar dos segmentos vulneráveis da população após a reforma. “É fundamental que o Estado não descuide desses segmentos desprotegidos”, opina.
A proposta de aposentadoria fásica do professor Arthur Bragança de Vasconcelos Weintraub foi apresentada a deputados na última semana, durante o Seminário Internacional sobre Reforma da Previdência, promovido pela comissão especial que analisa a PEC 287 na Câmara dos Deputados. O objetivo foi que os parlamentares conhecessem as experiências previdenciárias internacionais.