O Supremo Tribunal Federal (STF) julga, nesta quarta-feira (27), a ação cível ajuizada em outubro de 1991 pelo Estado de Santa Catarina contra o IBGE e os estados de São Paulo e Paraná, que questiona a definição da área geoeconômica marítima para fins de pagamento de royalties do petróleo. A Procuradoria Geral do Estado (PGE) argumenta que o IBGE traçou linhas de projeção das divisas estaduais com evidentes equívocos técnicos e jurídicos, em flagrante prejuízo ao Estado de Santa Catarina.
O governador Eduardo Pinho Moreira destacou a importância do julgamento. “A questão dos royalties é uma demanda de quase três décadas. Lembro que Pedro Ivo era o governador quando eu era deputado federal e nós já tratávamos desse assunto. Por justiça, é preciso que seja reconhecido que esses royalties da exploração de petróleo devam vir para o nosso Estado.”
Para Moreira, uma decisão favorável a Santa Catarina será um importante ganho do ponto de vista financeiro. “Nós esperamos que a Justiça seja feita. É um dinheiro não só do passado, mas também para o futuro. Vai permitir que tenhamos mais recursos para atender as necessidades básicas da população catarinense”, disse.
Campos estão em área de SC
Enquanto os campos de petróleo de Tubarão, Estrela do Mar, Coral, Caravela e Caravela do Sul deveriam se situar em área geoeconômica de Santa Catarina, a quem seriam devidas as participações governamentais estaduais decorrentes dessa exploração, o IBGE os situou em área do Paraná.
Além disso, os procuradores estaduais defendem que Santa Catarina também possui direito à parcela dos royalties referentes ao campo de petróleo de Baúna, que começou a produzir comercialmente apenas em 2012. É que esse campo, de acordo com a perícia técnica realizada durante a ação, situa-se em zona de projeção marítima compartilhada entre os três Estados.
O procurador do Estado Sérgio Laguna, que fará a sustentação oral em defesa de Santa Catarina no início do julgamento, a partir das 9h, ressalta que a definição das áreas de projeção marítima dos Estados também deve levar em consideração que toda a infraestrutura que viabiliza o trabalho nos campos de petróleo está em Santa Catarina.
“No caso do campo de Baúna, a exploração é feita tendo como base de apoio operacional o Porto de Itajaí e o Aeroporto de Navegantes, ambos em nosso Estado, enquanto os royalties auferidos, em razão do traçado equivocado do IBGE, são destinados a São Paulo”, afirmou, lembrando que os royalties são recursos pagos aos Estados e municípios para compensar os investimentos em infraestrutura e também eventuais impactos ambientais.
O procurador-geral do Estado, Juliano Dossena, estará em Brasília para acompanhar a sessão desta quarta-feira. “Não temos dúvidas sobre a legalidade do posicionamento de Santa Catarina. Por isso, acreditamos que os ministros do Supremo terão a oportunidade de reverter essa injustiça histórica contra os catarinenses”.
Repercussão financeira
O valor exato pago ao Paraná ainda é impreciso. Ele depende de um levantamento junto à Petrobras e à Agência Nacional do Petróleo. Contudo, com base em valores aproximados, pode superar R$ 300 milhões. A atual definição da divisa marítima também tem consequências sobre os poços de Baúna, cujos royalties (cerca de R$ 500 milhões ao ano) estão sendo pagos a São Paulo, quando deveriam ser divididos entre SC, PR e SP.
Detalhamento da ação
– Desde 1988, Santa Catarina busca assegurar o direito ao recebimento de royalties decorrentes da exploração de petróleo e gás dos campos Tubarão, Estrela do Mar, Coral, Caravela e Caravela do Sul, localizados no litoral próximo ao Estado.
– Questiona-se, em resumo, o método utilizado pelo IBGE para fixar a “divisa” marítima entre Santa Catarina e Paraná que, por consequência, define qual dos Estados tem direito ao recebimento dos royalties.
– É que o instituto não utilizou o critério correto (por causa da geografia côncava do litoral paranaense) e definiu que os campos localizados entre os paralelos de São Francisco do Sul e Itajaí, aproximadamente a 150 km da costa catarinense, estão em “águas paranaenses” e o direito aos royalties seria do Paraná.
– À revelia do critério legal utilizado para todos os demais Estados da Federação, o IBGE traçou uma linha reta ligando os extremos das divisas Santa Catarina-Paraná e Paraná-São Paulo, localizou o ponto médio (meio) e traçou uma reta perpendicular (ortogonal) até as 200 milhas – formando um triângulo. O critério correto, contudo, é bem diverso e mais complexo do que o adotado.
– Em 1991, como o IBGE não revisou administrativamente a sua interpretação, Santa Catarina ajuizou uma ação (Ação Originária Nº 444) no STF questionando o critério utilizado.
– O processo foi contestado pelas partes interessadas (IBGE, Estado do Paraná e Estado de São Paulo), bem como por vários municípios catarinenses e paranaenses que se manifestaram defendendo seus interesses específicos.
– Em 1995 é iniciada uma perícia técnica para avaliar os critérios usados pelo IBGE. O trabalho, realizado por engenheiro escolhido pelo ministro relator, foi acompanhado por assistentes técnicos indicados por SC, PR e pelo próprio instituto. A perícia concluiu que a tese defendida por Santa Catarina está correta e que o critério adotado pelo IBGE está errado.
– A perícia técnica concluiu que: “O IBGE não adotou, como previsto pela Lei: Linhas de Bases apoiadas em pontos apropriados, nem cartas náuticas em escala adequada e não usou o conceito de limites de plataforma definidos pelo Decreto n. 93.189 […]. Usou critérios arbitrários para lançar linhas de base […]”.
– Em 2001, a Procuradoria Geral da República (Ministério Público Federal), pelo seu procurador-geral, emitiu parecer favorável à tese de Santa Catarina – ou seja, que a ação deveria ser julgada procedente (as divisas a ser consideradas são as que o Estado de Santa Catarina defende) e, consequentemente, que os royalties deveriam ter sido pagos para Santa Catarina.
– Esta é a conclusão do parecer do então procurador-geral da República, Cláudio Fonteles: “Assim, evidencia-se a ilegalidade do critério adotado pelo IBGE para definição da projeção dos limites interestaduais marítimos relativos ao ESTADO DO PARANÁ, em franco prejuízo ao ESTADO DE SANTA CATARINA, uma vez que o pagamento de royalties pela exploração dos poços localizados nas áreas em conflito está sendo realizado ao primeiro, quando na verdade deveriam ser feitos ao último.”
– Em 2004, o processo já estava pronto para julgamento. Porém, os réus defenderam que a edição do Decreto 4983, daquele mesmo ano, poderia alterar as conclusões da perícia.
No entanto, esse decreto não traz repercussões práticas para a controvérsia, porque não fixou pontos apropriados no litoral paranaense, não retratando a sua realidade geográfica.
– Entre 2009 e 2015, por iniciativa do ministro relator, as partes tentaram uma conciliação, mas, sem acordo, o procedimento foi encerrado.