O Supremo Tribunal Federal (STF) confirmou tese defendida pelo Estado de Santa Catarina de que é inconstitucional a manutenção em cargo público, com fundamento na Teoria do Fato Consumado, de candidato que ingressou no serviço público a partir de decisão liminar. Recente acórdão publicado pela Primeira Turma do STF confirmou decisão monocrática do ministro Alexandre de Moraes, de novembro de 2018.
A Procuradoria Geral do Estado (PGE) recorreu de decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) que havia mantido no cargo um candidato reprovado em concurso para bombeiro militar. O servidor somente ingressou na corporação em razão de liminar da Justiça, mas a PGE vinha recorrendo das decisões desde 2016, argumentando que a manutenção era inconstitucional e contrariava jurisprudência do Supremo.
“O Princípio do Concurso Público tem evidente primazia sobre qualquer interesse individual. Ainda que a corte local, sensível ao caso concreto, tenha tentado resolver o impasse em prol de um vislumbrado interesse público, a Constituição e a jurisprudência do STF sinalizam em sentido contrário. O Estado Democrático de Direito pressupõe exatamente a aplicação igualitária das leis e da Constituição, aplicação esta que não se conforma com privilégios, como a investidura em cargos públicos em hipótese onde o candidato não foi aprovado no respectivo concurso público”, ressaltou a procuradora do Estado Edith Gondin, no recurso ao STF.
A PGE ainda destacou a existência de tese consolidada no Supremo pelo Tema 476 de repercussão geral desde 2014: “Não é compatível com o regime constitucional de acesso aos cargos públicos a manutenção no cargo, sob fundamento de fato consumado, de candidato não aprovado que nele tomou posse em decorrência de execução provisória de medida liminar ou outro provimento judicial de natureza precária, supervenientemente revogado ou modificado”.
O ministro Alexandre de Moraes reconheceu que a decisão do TJSC era contrária à jurisprudência da Corte e julgou a favor do Estado. “Dessa forma, verifica-se que o Tribunal de origem afastou-se desse entendimento ao decidir por manter nos quadros do Comando Geral do Corpo de Bombeiros Militar do Estado de Santa Catarina, candidato que fora anteriormente reprovado no teste de aptidão física, embora, em razão de decisão liminar, tenha logrado êxito nas fases subsequentes, em flagrante violação ao princípio da isonomia que deve permear os certames públicos”, decidiu Moraes, o que foi confirmado pelos demais ministros da Primeira Turma, Marco Aurélio, Luiz Fux, Rosa Weber e Luís Roberto Barroso.
Atuaram na defesa do Estado, além da procuradora Edith Gondin, os procuradores Kátia Simone Antunes e Gian Marco Nercolini.
Entenda o caso
– Em 2012, um candidato ao concurso público para bombeiro militar em Santa Catarina foi reprovado no teste físico. Ele acionou a Justiça e conseguiu liminar para garantir a continuação nas demais etapas da prova.
– Em 2016, embora a perícia realizada no processo tenha confirmado que o candidato não realizou os exercícios na forma determinada no edital do concurso, sentença, com base na Teoria do Fato Consumado, afastou a reprovação do autor na avaliação física e garantiu o ingresso no serviço público como bombeiro militar.
– Em seguida, a PGE recorreu da decisão ao TJSC, que manteve a decisão de primeiro grau levando em consideração os princípios da boa-fé, segurança jurídica e razoabilidade, além do suposto investimento feito pelo Estado na formação do servidor e a expressa manifestação do comandante-geral do Corpo de Bombeiros que solicitou a permanência do candidato na corporação.
– Em 2017, após novo recurso da PGE alegando afronta à jurisprudência do STF, o TJSC, em juízo de adequação, reviu o posicionamento e reverteu a decisão favoravelmente ao Estado. No entanto, o autor recorreu e o TJSC mudou o entendimento mais uma vez para manter o candidato na corporação.
– A PGE recorreu, então, ao STF, alegando a inconstitucionalidade da decisão do TJSC de manter no serviço público candidato reprovado no concurso.
– Em novembro de 2018, o ministro Alexandre de Moraes, em decisão monocrática, reconheceu que o TJSC julgou o caso de forma contrária à jurisprudência do STF, confirmando a tese defendida pela PGE.
– O autor recorreu novamente ao STF, que, em acórdão da Primeira Turma publicado no mês de fevereiro de 2019, confirmou a decisão do ministro e encerrou o processo com vitória para o Estado de Santa Catarina.