Thais Carrança/Valor Econômico – A reforma da Previdência pode ter efeito recessivo sobre a economia brasileira, caso não ocorra um aumento relevante do investimento privado em resposta à melhora da confiança, alerta o Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional da Universidade Federal de Minas Gerais (Cedeplar/UFMG), em nota técnica publicada nesta semana.
Com um modelo que estima o impacto sistêmico da redução dos pagamentos de aposentadorias e pensões pelo governo sobre a renda das famílias – e suas consequências sobre o consumo, atividade econômica, investimento, preços e comércio exterior -, os economistas estimam que uma reforma com economia para os cofres públicos de R$ 800 bilhões em dez anos teria um impacto sobre o Produto Interno Bruto (PIB) de -1% a 2% no acumulado da década, a depender da resposta do investimento.
O estudo mostra ainda que cortes no Regime Geral de Previdência Social (RGPS) pioram a desigualdade de renda entre as famílias, enquanto reduções nas aposentadorias do setor público (RPPS) melhorariam a iniquidade, um argumento em favor da proposta de alíquotas progressivas para os servidores, na visão dos pesquisadores Edson Paulo Domingues, Débora Freire Cardoso, Luís Eduardo Afonso e Guilherme Cardoso, do Cedeplar.
Para realizar o cálculo, usaram um modelo de equilíbrio geral computável, que permite estimar como variações na renda das famílias afetam a economia como um todo. Além disso, foram adotados dois cenários para a resposta do investimento ao corte de benefícios. Num deles, o investimento apenas responde à queda da demanda como resultado da redução da renda disponível das famílias. No outro, a queda da despesa do governo com Previdência seria integralmente substituída por aumento equivalente do investimento privado.
Essa segunda hipótese é considerada, no entanto, muito otimista pelos pesquisadores. Em primeiro lugar, porque não há consenso na economia sobre o efeito da confiança sobre o investimento, afirma Débora. Além disso, a morosidade da queda da taxa básica de juros, recuperação muito lenta da atividade passada a recessão, ausência de espaço fiscal para o crescimento do investimento público sob a regra do teto de gasto e redução do papel do BNDES como banco de financiamento são fatores que jogam contra uma retomada mais forte do investimento privado, avaliam os autores do estudo.
“Só a reforma da Previdência, se o investimento não responder dessa forma tão otimista quanto alguns economistas estão prevendo, coloca de fato a possibilidade de um cenário recessivo”, diz Débora, frisando que ela e seus coautores são plenamente favoráveis à aprovação da reforma, mas avaliam que a mudança deve ser acompanhada de medidas de estímulo ao investimento, como queda dos juros, revisão do teto de gastos e uma reforma tributária com viés redistributivo.
Simulando o efeito de um corte de R$ 1 bilhão nos benefícios do regime geral, na Previdência dos servidores públicos e no Benefício de Prestação Continuada (BPC), os pesquisadores encontraram que a redução do benefício para idosos e pessoas com deficiência de baixa renda é a que teria efeito mais drástico para piora da desigualdade – resultado que respalda a retirada desse ponto do texto final.
No entanto, alertam os pesquisadores, a mudança no regime geral também tende a piorar a desigualdade do país, embora em menor escala do que o BPC. “Não estar atento aos impactos socioeconômicos da reforma implica ampliação das desigualdades, em um país onde não existe mais espaço pra isso”, conclui Débora.