*Rafael Alvim e Felipe Moreira
Dentre os capítulos que compõem o título que trata da intervenção de terceiros no Novo Código de Processo Civil (NCPC), está aquele dedicado a uma figura peculiar: o amicus curiae, ou também conhecido como “amigo da Corte” ou “colaborador da Corte”.
Melhor do que traduzir literalmente a expressão é entender que o amicus curiae representa verdadeiro portador de interesses institucionais dispersos na sociedade, a conformar uma releitura do contraditório em questões que ultrapassam interesses meramente particulares (cf. BUENO, Cássio Scarpinella. Amicus curiae no processo civil brasileiro. Um terceiro enigmático. São Paulo: Saraiva, 2008).
A ideia em si é relativamente simples: se determinada decisão irá atingir toda a coletividade, nada melhor que sejam admitidas em contraditório as pessoas, físicas ou jurídicas, que carreguem adequada representatividade para contribuir e trazer elementos informativos para a prolação de uma melhor decisão. Dessa forma, obter-se-á uma decisão melhor “informada” e consequentemente, que gozará de maior legitimidade democrática.
Mesmo sem previsão legal expressa utilizando a nomenclatura latina, os amici curiae vem sendo admitidos pela jurisprudência brasileira há algum tempo, sobretudo nos específicos processos de controle concentrado de constitucionalidade, nos quais a intervenção se fundamenta basicamente nos artigos 7º, §2º, e 20, §1º, da Lei Federal nº 9.868/99 (ADI e ADC), e no artigo 5º, §2º, da Lei Federal nº 9.882/99 (ADPF).
E o Supremo Tribunal Federal parece ter compreendido as inúmeras vantagens de se ter esse respaldo democrático em decisões que tratam de assuntos polêmicos. Basta contar, por exemplo, os diversos amici curiae que participaram da decisão na ADPF 132, que reconheceu a união homoafetiva como entidade familiar.
O NCPC trata especificamente dessa importante figura processual no seu artigo 138, dispondo que: “O juiz ou o relator, considerando a relevância da matéria, a especificidade do tema objeto da demanda ou a repercussão social da controvérsia, poderá, por decisão irrecorrível, de ofício ou a requerimento das partes ou de quem pretenda manifestar-se, solicitar ou admitir a participação de pessoa natural ou jurídica, órgão ou entidade especializada, com representatividade adequada, no prazo de 15 (quinze) dias de sua intimação.”.
As especificidades aptas a autorizar a presença dos amici curiae no processo são de três ordens, quais sejam: relevância da matéria, especificidade do tema objeto da demanda ou repercussão social da controvérsia. Verifica-se, pois, que se está diante de requisitos bastante subjetivos, que ficarão a cargo do órgão judicial competente.
Ainda, o mesmo dispositivo possui três parágrafos, dispondo, em síntese, que esse tipo de intervenção não altera a competência do órgão julgador, nem autoriza a interposição de recurso pelo amicus curiae, ressalvada a oposição de embargos de declaração e de recurso nas decisões que julgarem incidentes de resolução de demandas repetitivas (v. NCPC, arts. 976 e seguintes). Por fim, caberá ao juiz ou ao relator, na decisão que solicitar ou admitir a intervenção, definir os demais poderes do amicus curiae no processo.
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*Rafael Alvim e Felipe Moreira são analistas do Instituto de Direito Contemporâneo