Assistir ao documentário “Sem Palavras”, de Kátia Klock (2009), me provocou uma reflexão em relação ao cenário político atual e suas manifestações em Antônio Carlos/SC. A obra traz à tona memórias de descendentes de alemães em Santa Catarina que viveram sua infância durante o Estado Novo, ditadura de Getúlio Vargas, e foram marcadas pela Campanha de Nacionalização do regime. Esta campanha, a saber, foi um conjunto de medidas tomadas a partir da década de 30 a fim de integrar forçosamente os imigrantes à sociedade “brasileira”. Dentre elas estava a proibição do uso do dialeto alemão (assim como o italiano e outros) e a destruição de livros e outros objetos de lembrança das raízes estrangeiras, podendo resultar na prisão daqueles que ousassem pronunciar sua língua materna. Os relatos mostram com profundidade os estigmas guardados por pessoas que viveram grande parte de suas vidas cobertas de medo, presas no silêncio (pois nunca aprenderam o português), e de outros que foram aprisionados e torturados pelas forças do Governo pelo simples crime de falar a língua de seus pais.
Me impressiona ver nos dias de hoje descendentes dessa gente tão amargurada e sofrida por causa do Nacionalismo getulista se afirmando “patriota” e defendendo os dizeres nacionalistas do atual presidente. Para mim isto não é senão falta de conhecimento histórico destas pessoas para que não percebam que a base do pensamento integracionista e “patriota” de Jair Bolsonaro e seus seguidores é a mesma daquela de Getúlio Vargas, que quase extinguiu a cultura germânica dos imigrantes que povoaram o Alto Biguaçu e outras tantas localidades Brasil afora. Devem se revirar no caixão, os bisavós, ao ouvir o que seus bisnetos papagueiam hoje!
Me entristece, como descendente de alemães, saber que a cultura de meus antepassados, aquela que haveria de ser a minha cultura, foi desprezada pelo Fascismo de Vargas e quase erradicada de nossa memória coletiva, assim como me entristece perceber que aqui são poucos os que se dão conta de quão perigoso é colocar seu país acima de tudo.
Tendo em vista o estado debilitado da cultura remanescente dos imigrantes (não só alemães, como também africanos, açorianos e outros), a meu ver, a comunidade de Antônio Carlos precisa urgentemente de mais investimentos culturais que trabalhem com o campo da memória, como um museu de História ou o prometido curso de dialeto Hunsrückisch, por exemplo, para tentar superar esta nossa falha crônica de memória coletiva. Esforços desse tipo podem ajudar a apagar a chama do Chauvinismo, o Nacionalismo exacerbado, que permanece acesa em nossa Sociedade e dá possibilidade a novos incêndios fascistas.
Sandro Pauli Jr
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